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    Segunda, 28 Novembro 2022 22:41

    Erro ou ilusão?

    Qual você prefere: estar errado ou iludido? Prefiro estar errado e explico contando um caso acontecido na cidade de Chicago.

    Um disco voador deixou de pousar no quintal da casa de Dorothy Martin, onde adeptos da “Fraternidade dos 7 Raios” esperavam no maior medo serem salvos de um dilúvio pior que o da Bíblia. Dorothy tinha recebido mensagem de um ET do Planeta Clarion de que no dia 21 de dezembro de 1954 a Terra seria arrasada por um dilúvio. Mas quem acreditasse, com muita fé, seria resgatado por um Disco Voador.

    Só que o Disco não veio. Decepção? Nada! Dorothy contou, no dia seguinte, que recebeu nova mensagem: a energia do grupo foi tão forte que espantou o dilúvio talvez para Marte ou Saturno. A Terra foi salva pela fé da turma (que cabia num quintal de casa) e a Fraternidade dos 7 Raios dobrou o número de fiéis. Em vez de cair em descrédito, a profetiza virou Mito. Ninguém pensou que pudesse ser mentira ou feiqueniu.

    Isso que você acabou de ler não é invenção minha. Está no livro de Leon Festinger “When prophecy fails” (“Quando a profecia falha”), publicado em 1956 (depois do milagre). João Cezar de Castro Rocha, em artigo intitulado “Brasil é laboratório de criação de realidade paralela”, retoma o caso para explicar a diferença entre ilusão e erro.

    A ilusão tem a ver com crenças em doideiras, fantasias, pesadelos. É um estado de sonambulismo. Não dá para comprovar, testar, de maneira que não tem como saber se tem base na realidade. Ou você crê (e vai para o quintal da Dorothy esperar o disco voador) ou não crê e fica em casa vendo a previsão do tempo.

    O erro é diferente. É possível verificar se é verdadeiro ou falso. Exemplo: você escreve num papelzinho o endereço do amigo que mora numa cidade aonde nunca foi. Pega um táxi, chega ao lugar, toca a campainha, aparece um desconhecido. Não é o amigo. Endereço errado. Como fazer? Aceitar a realidade, informar-se e encontrar o endereço certo. Foi um erro, pode ser corrigido.

    Na vida, estamos sempre lidando com erros: chamar um Zé por Pedro, ele te corrige: meu nome é Zé; dizer que 2 mais 3 são 7 – a professora corrige: 5; botar açúcar em vez de sal; apertar a tecla do “delete” quando queria salvar; colocar o despertador para as 3 quando queria 15. Erros são verificáveis e corrigíveis.

    A ilusão é parenta do sonho, do pesadelo! Dorothy fala: vai ter dilúvio. Não teve. De onde ela tirou a informação? De um ET do planeta Clarion. Qual? Como? De que distância? Onde se localiza no Universo? Tem jeito de comprovar? Quem acredita corre para se salvar no quintal da Dorothy ou se arrisca a morrer afogado. Qual você prefere? Morrer afogado? Na dúvida, melhor conferir, fazer um esforço – como fez o Leon Festinger – e esperar o disco voador. Já é uma doideirinha, o ser humano é inclinado a fantasias. Mas continuar nessa acreditação sem fim? A energia da turma salvou a Terra?

    Crenças servem para manter a coesão do grupo, como explica Yuval Harari no livro “Sapiens”. Crenças em símbolos, mitos, dogmas mantêm milhões de pessoas nos quintais, reunidas em torno de Dorothys e Salvadores da Pátria. Pode-se tornar histeria perigosa, como aconteceu com os 918 adeptos do Templo do Povo, de Jim Jones, na Guiana, no dia 18 de novembro de 1978, que praticaram um suicídio coletivo.

    Para o erro, a solução é corrigir. Para a ilusão, é acordar: um balde d´água fria no dorminhoco assusta, mas acorda.

     

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