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    Quarta, 16 Janeiro 2019 11:42

    Até o carro vai passar?

    Sento-me diante da TV no apartamento de meu amigo médico. A esposa também é médica. Têm uma filha de doze anos. Pergunto se posso ligar. Ele me responde que não adianta, o aparelho não capta nenhum canal. Nem Globo, nem SBT, nem Band. Nada. Ninguém vê TV. Na verdade, a pergunta foi de mentirinha. Nem eu estava interessado em ver “programa” ou saber “notícia”. Mas foi interessante constatar que esse casal de médicos não vê tevê. Nem a filha.

    Quanta diferença se estivéssemos em 1970, quando TV era indicador de modernidade. Hoje, nem passados 50 anos, esse extraordinário aparelho entrou no time dos eletrônicos superados. Está indo para o lixo como foi o radinho de pilha, que os jovens da época de Elvis Presley e Beatles carregavam com ostentação, mostrando como eram avançados. E curtiam as músicas, as notícias, as publicidades.

    Foi-se também o telefone fixo, que as famílias lutavam por possuir, pagando caro o direito de uma linha com o número, de início 4 algarismos. Surgiu como grande novidade, e era uma vitória quando se conseguia fechar o circuito e ouvir a voz desejada do outro lado. Pedia-se à moça da telefônica – que funcionou na rua Gérson Duarte Coelho, atual agência de imóveis ABM. Fazer um interurbano – de São Gotardo para BH ou Araxá, por exemplo – custava caro e exigia tempo e paciência. Mesmo assim, os passadores de trote conseguiam fazer ligações para o general Geisel e chamar o Antônio da Luca para conversar com ele. Era comum um engraçadinho chamar alguém de madrugada para dizer que enganou de número. (Talvez por isso inventaram a bina!) Pois esse telefone fixo ainda existe, mas com bem menos prestígio que no século passado. O celular, ao que tudo indica, vai despachá-lo para o museu.

    Ele próprio teve melhorias ao longo do período em que brilhou. De início, os números eram acionados com o dedo indicador que girava uma peça na base do aparelho, o 1 rapidinho, o zero custava a girar. Depois apareceu um telefone móvel, cujos números eram rapidamente digitados. Muito mais confortável falar andando para cá e para lá.

    Para ouvir música, um jovem de 1970 precisava comprar uma eletrola, um disco de vinil de 78 rotações, que evoluiu para 25 rotações. A diferença era grande. No primeiro, mal cabiam duas músicas; no outro, houve um avanço notável: 16! Os discos precisavam ser cuidados, mantidos limpos e jamais poderiam ser riscados. A agulha tinha que ser nova para produzir um som de alta fidelidade. Vitrolas, radiolas, eletrolas tiveram vida curta. Logo apareceu o CD, menor e com mais músicas. Nem bem o século terminou, veio o computador, o pendraive, e aquelas maravilhas eletrônicas viraram lixo. O jovem do novo milênio nem sabe do que estou falando.

    Eles não têm dificuldade alguma. Com um aparelho minúsculo, não só dispõem de centenas de composições quanto são capazes de produzir um volume tão alto quanto grandes caixas de som. E com a multiplicação irrefreável dos automóveis, com sons instalados e mais os amplificadores, o volume aumentou exponencialmente.

    E por falar em automóveis, está passando de hora de eles também tomarem o mesmo caminho. Em 1950, circulavam na cidade alguns jipes e carros fechados (como se dizia) de fazendeiros, médicos e advogados. Agora há carros por todo lado, inclusive nos bairros novos. Aumentam os estacionamentos pagos, pois está difícil achar vagas nas ruas. Mas, ao que tudo indica, e pela lei implacável do progresso, em breve estaremos desativando também os carros (pelo menos os particulares).

    Vamos partir para as bicicletas e o uber, como já se faz no Primeiro Mundo. É uma boa escapar das amolações de IPVA, seguro, CNH, multas, rotativos, estacionamentos, seguro. Já há especialistas de economia dizendo que fica mais barato do que possuir um carro. Em caso de uma viagem maior, a opção é alugar um veículo com motorista e tudo.

    E a cidade vai ganhar. Menos barulho, poluição, veículos em circulação, acidentes, perigo para as crianças. Não só a cidade, mas as pessoas e o planeta. Só o PIB vai perder. Mas essa é outra história. Afinal, PIB?

     

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