Nos primeiros 15 anos desde sua emancipação o comando político/administrativo em São Gotardo estava centrado na figura do presidente da Câmara Municipal. Ele preenchia a um só tempo as funções de Legislador, executor de obras e controlador das finanças públicas. Ainda não existia, até o início da década de 1930, o cargo de prefeito.
No ano de 1934, ao ser promulgada a nova Constituição Brasileira, Getúlio Vargas, que havia liderado o golpe na chamada revolução de 30, é eleito presidente do Brasil. Paralelamente era reimplantada nos estados e municípios a nova ordem constitucional. Registre-se que no hiato entre 1930 e 1933 o governo municipal foi controlado por interventores, nomeados diretamente pelo governador.
Em 1934 foi eleita a nova Câmara Municipal, agora, com poderes para empossar o primeiro prefeito de São Gotardo. O novo título vinha embalado com as cores do getulhismo: o de “Prefeito Discricionário”. Através de votação entre os vereadores foi escolhido para o cargo um jovem farmacêutico, Bento Ferreira dos Santos. A posse do primeiro prefeito coincide assim, com um período crítico de nossa história: A era Vargas - que três anos depois, em 1937, assume sua real natureza ditatorial com a instalação do Estado Novo, o que se estendeu até 1946.
Por ordem e anuência do andar lá de cima Bento Ferreira permaneceu no cargo de prefeito durante todo este período, de 1933 a 1946. Foi o governo mais longevo nestes 100 anos de história. Sua permanência no cargo evidencia, apesar do intervencionismo federal e estadual, as habilidades de um político nato. Ao ser ungido pelos coronéis Frederico Coelho e Antônio Fonte Boa, e por duas vezes sacramentado na Câmara de vereadores( em 1934 e 1937) para ocupar o cargo de prefeito - ainda que biônico - demonstrava uma capacidade inerente de líder e aglutinador das forças representativas do município.
O manipulador de Fórmulas e Destinos
São Gotardo ainda engatinhava às margens do córrego confusão quando Bento Ferreira, recém-formado pela escola de Odontologia e Farmácia de Belo Horizonte, resolveu mudar-se para cá, no ano de 1921. Um ano depois, já estabelecido profissionalmente, casa-se com Maria Guiomar, uma professora, também recém-formada. Ao longo destes primeiros anos na nova terra Bento Ferreira participa ativamente da vida pública do município, principalmente nas áreas de esporte, saúde e comunicação.
O Legado
Ao longo dos 13 anos de seu governo, o acadêmico e progressista Bento Ferreira dos Santos fincou importantes marcos na construção das bases do jovem município.Listamos abaixo algumas das obras realizadas durante sua gestão:
- Usina do Abaeté( inaugurada em 1935)
- São Gotardo é alçada à posição de Comarca(1936)
- Instala o novo cemitério(onde é hoje)
- Lançamento da pedra fundamental da Igreja Matriz(1935)
- Construção do Matadouro Municipal
- Reurbanização da cidade com abertura de novas ruas e praças
- Construção da Vila Vicentina
- Dirige a Escola Normal e a Santa Casa
Um fim melancólico
Em 1947 Bento Ferreira dos Santos é apeado do cargo de prefeito pelas forças políticas locais. Foi uma derrota tão amarga que resolveu mudar-se – melhor dizendo, exilar-se - de São Gotardo com a mulher e seus treze filhos. Em Niterói – RJ assume um cargo público, a convite do governador daquele estado. Nunca mais retornou à cidade que o acolheu e que ajudou a construir. Em 1965 recebeu o título de cidadão honorário. Na cerimônia foi representado por uma de suas filhas.
Bento Ferreira dos Santos não foi um filho bastardo: a terra do confusão foi sua genitora e mãe legítima. Seu auto-exílio ou a pecha de prefeito da ditadura não foram capazes de manchar o legado que nos deixou. Agora, em 2015, no ano de seu centenário, a cidade de São Gotardo tem a oportunidade de reconhecer e reavivar o lustre dos artífices de nossa história. Bento Ferreira dos Santos tem lugar de destaque neste panteão. Ele veio e se foi. Uma espécie de cometa brilhante, mas que permanece eternamente estacionado na rua principal de São Gotardo.